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segunda-feira, 31 de agosto de 2009

Parte III




Vou à parede e examino o retrato,


irresponsável-amarelo-acinzentado-testemunha.


Meus olhos não se abrem e mesmo assim o vejo.


E mesmo assim te vejo, ó menino, encostado à palmeira de tua praça


e sem querer sair.


E mesmo assim te penso dique,


desolação de seca na caatinga, noite de insônia,


canção antiga ao pé do berço,


prata


fósforo queimado


poço interminável, seco.


Ouço teu sorriso e te obedeço.


Eu que desaprendi a preparação do sorriso


e não o consigo mais.


Estou preso a ti, ainda agora,


apesar do cabelo escurecido,


as mãos maiores e mais magras


e um súbito medo de morrer, amor à vida, tolo.


tenho preso a ti a palavra primeira


e o primeiro gesto de enxergar o espelho:


ouço-te, sou mais desgosto em mim, imcompreensível.


À tua ordem decido não envergonhar-me de existir


nesta forma disforme e de osso


carne


algumas coisas químicas


e uma vontade de estar sempre longe,


visitando países absurdos.



Não posso envergonhar-me de ser homem.


tenho um menino em mim que me observa


e ele tem nos olhos


(qual a cor?)


todas as manhãs e tardes e manhãs com sol e chuva


e eu menino, que me alumiava.



Tenho um menino em mim e ele é que me tem:


por isso a corcunda precoce


e os olhos banzos: tenho o corpo voltado à sua procura


e meu olhar apenas toca, e leve,


a exata matriz da calça


molhada em festa vespertina da bexiga.
 
 #Torquato Neto